23 de ago. de 2010

Queria que fosse mais fácil me convencer

De que eu tenho feito todo o esforço que posso. Que tudo vai se resolver. Que ver, ler e ouvir tudo o que eu vejo, leio e ouço também é uma maneira de estar trabalhando. Mesmo que as coisas que eu vejo, leio e ouço não tenham nada a ver com dança. Que quando a gente faz essas coisas que gosta, elas refletem no trabalho. Que o trabalho nos traz dinheiro na medida em que a gente acredita, desenvolve e nutre ele desse desejo e paixão por estar fazendo, mesmo sem fazer. Que o meu joelho não vai piorar e que no próximo ano eu não vou ficar de molho por causa dele de novo. De que as coisas que eu penso que, com a idade que eu tenho, já deviam estar resolvidas; não são tão simples de resolver. E que a maioria das pessoas na minha idade estão na mesma situação.
Queria que fosse mais fácil me convencer de que ficar puto da cara com a dependência financeira não vai resolver o problema. Que isso é uma manifestação de orgulho e por isso não é legal. Queria me convencer de que de repente o melhor caminho é colocar a minha viola no saco, parar com essa besteira de querer ser artista e ir logo fazer alguma coisa que me dê dinheiro. Que algumas pessoas ajudam as outras por que as amam e querem vê-las progredir sem exigir nenhum retorno a curto prazo ou de valor tangível. Queria me convencer mais facilmente de que eu não negligencio meus amigos e a minha família. Queria que o mesmo acontecesse com relação à pessoa que eu amo. Queria também me convencer de que não sou negligenciado por essas pessoas.
Queria me convencer mais facilmente de que nem tudo que eu intuo é verdade ou aconteceu de fato. Que o problema é mesmo a minha criatividade e o meu dom pra drama-queen. Que eu continuo tão emotivo e coração mole quanto sempre fui e que não me endureci nos últimos dois anos. Que chorar continua sendo ok. Que continuo sendo muito amado. Que refletir sobre as coisas é um exercício lindo e que deixar o efeito dessa reflexão aparecer; ainda que seja em forma de tristeza, ou um mal-humor terrível: também é ok.
Que eu de fato preciso parar de fumar, tomar tanto café e comer melhor. Que a minha mãe tem razão em 70% das coisas que ela me diz. Que Porto Alegre continua linda mas, que trabalhar com arte aqui continua sendo uma merda. Queria me convencer de que a dança no Rio Grande do Sul não está cada vez mais sucateada.
De que eu não estou sucateado.
De que o amor não está sucateado.
E mais várias outras coisas que eu tento, mas não consigo me convencer.

Um comentário:

Tania Velázquez disse...

gostei do que escreve e me identifiquei muito, quando diz que queria se convencer de que é difícil viver de arte. É verdade, mas se não fazemos o que gostamos, o que será da nossa vida?
Seria bom conciliar a arte e um trabalho que dê um salário para poder sustentar a sua arte. Deixar um dom que você tem, jamais...nem pense nisso! Eu larguei tudo numa época que brigava com arteXtrabalho, só para me dedicar ao trabalho e o que aconteceu foram vários estados de depressão, alternados pelo tempo vivido numa cidade que eu nunca gostei e que por medo, não pensava que poderia mudar tudo e ir embora para Porto Alegre.
Um abraço